Embora poucos se deem conta, toda a fuga envolve um destino. E, não obstante, cada destino contempla um encontro, mesmo que com o vazio de si mesmo. A rigor, as estratégias de libertação ou de desenlace do mundo que desenvolvemos são fortuitas e ineficazes, pois vão escondendo desejos proibidos ou negligenciados. Vão, quem sabe, abrindo as cortinas que permitiam a visão apenas das sombras daquilo que encobriam. Na maior parte das vezes, não gostamos do que aparece de maneira desvelada.
Meu hábito de fuga tende a acontecer em meio às palavras. É, assim como qualquer outro, inútil e fadado ao fracasso, já que são elas as responsáveis por me escancarem sem rodeios. Não pedem permissão, mas estão sempre autorizadas, uma vez arranjadas por mim mesma. O conflito com o encontro é a matéria-prima do desencontro e, nesse ciclo interminável, vou desabotoando zonas cinzentas do meu peito e olhando fundo nos olhos quase fechados de dores antigas que, em teimosia perpétua, vão assolando à medida que são desassistidas.
Sobre fugas, então, receio que haja pouco a ser dito e muito a ser observado. As esquinas onde paramos, os becos onde, deliberadamente, decidimos descansar. Não ver saída é, por vezes, a estratégia mais eficaz para nos liberarmos temporariamente da responsabilidade de ser quem somos. Há vezes que se torna exaustivo, eu bem sei. Contudo, não deixa de ser um estado provisório e com os instantes contados, seja por nós mesmos ou pelos olhos que, sem muita demora, vão assumindo o papel de vigilantes. A propósito, não há como escapar de ser vigiado no mundo em que vivemos.
Essa agonia, então, pode ser que nos consuma em momentos de exacerbada lucidez. Por essas e outras, as fugas também estão dentro dos copos e dos pratos. Por vezes, são saboreadas dentro dos corpos e das multidões. No final do dia, entretanto, o embate com o espelho e os passos por dentro do labirinto dos pensamentos são horizontes confirmados. Fechar os olhos também não adianta, mesmo que seja esse o ímpeto por vezes.
O desfecho? Nenhum. A meu ver, quanto antes exercitarmos um certo ceticismo sobre o desenrolar dos enredos, melhor. Não se trata de pessimismo, mas de uma alternativa sensata de aproveitar mais a própria companhia, tendo em vista que ela é, inevitavelmente, o destino de qualquer fuga.